Estava voltando para casa hoje,
vindo de Mar Grande, cansado depois de dois dias de trabalho (dou aula lá sexta
à noite, e sábado pela manhã em Tairu, a 32km de distância de Mar Grande).
Peguei a lancha no terminal. Logo ao entrar, para minha tristeza, vi um sujeito
mal-acabado, mal-encarado, segurando uma prancha enorme, um par de óculos
ridículo na cara e com o som do celular ligado no último volume. Não sentei na
proa da lancha para apreciar a paisagem, como havia pensado em fazer, por conta
disso – ele estava lá, e eu não quis ficar perto dele. Tive de ficar no meio da
embarcação, com um monte de gente na minha frente e sem conseguir ver o mar. Um
saco! Eu, cansado, com fome, com sono, a fim de fazer a travessia Mar
Grande-Salvador em silêncio e receber aquele ventinho na cara, viajei tendo de
aguentar o barulho feito pelo celular daquele sujeitinho. E eu não pude falar
nada, pois, se falasse, certamente ele e o outro mal-acabado que estava com ele
me atirariam na Baía de Todos os Santos. Sabe como é, ele quer ouvir o som dele
no último volume, num espaço público, e os outros que aguentem - ou então tapem os ouvidos.
(Certa vez, peguei um ônibus em direção
ao subúrbio, meu local de trabalho às quartas. Achei um lugar para sentar –
coisa rara, visto que os ônibus que transitam para aquela região parecem mais
paus de arara do que transporte público coletivo [moradores do subúrbio de
Salvador, não me apedrejem; vocês também reclamam dos ônibus socados de gente
que são obrigados a pegar todo dia]. Após me acomodar, um safardana, sentado a
duas fileiras atrás de mim, ligou o celular dele no último volume. Último
volume mesmo; nunca vi um celular com um som tão potente como aquele. Parecia
mais um trio elétrico. Após me assustar com a pancada do som no meu ouvido e olhar
para trás a fim de ver quem havia feito aquilo, o sujeito não gostou e, ato
contínuo, gritou: “QUE FOI, IRMÃO?!! TÁ INCOMODADO?? NÃO GOSTOU NÃO?! ENTÃO,
DESÇA E PEGUE TÁXI”. Resolvi ficar calado, pois ele poderia partir para cima de
mim e me matar de porrada – ou meter uma bala no meio da minha testa, caso
estivesse armado. Afinal de contas, eu sou grande, mas não sei bater em
ninguém. E não faço questão de aprender, pois eu não gosto de violência.)
Mas retomando minha peripécia Mar
Grande-Salvador, como se não bastasse, a viagem foi péssima. O mar estava muito
revolto, e por isso a embarcação balançou bastante – tanto na ida como na volta.
Ainda bem que eu não enchi a barriga antes de viajar, pois, se eu tivesse feito
isso, haveria uma possibilidade muito grande de, em virtude do sacolejo
constante e interminável, eu vomitar tudo em cima de quem estava sentado na
minha frente. E se isso acontecesse, eu provavelmente não teria escrito esse
texto.
Finalmente, desembarquei. Como eu
estou evitando ao máximo entrar na Estação Pirajá (uma
estação de transbordo de Salvador), decidi andar até o ponto do Instituto do
Cacau, no bairro do Comércio, para pegar um ônibus que me trouxesse para
Cajazeiras sem a necessidade de ter de descer no meio do caminho para pegar
outro. Depois de cerca de dez minutos parado no ponto, apareceu um micro-ônibus
que fazia a linha São Gonçalo-São Joaquim dirigido por um ex-vizinho e coligado
meu (que eu não via há um bom tempo). Ao me reconhecer, ele parou perto de mim
e perguntou se eu aceitava uma carona até o Largo do Tanque. Como eu nunca fui
ao São Gonçalo (até porque eu nunca tive o que fazer lá), perguntei se a linha
era via Liberdade ou Av. San Martin. Ao ouvi-lo dizer que a linha era via San
Martin, resolvi aceitar e descer no Retiro, pois, lá, é mais fácil pegar um
ônibus para Cajacity.
Maldita hora em que eu aceitei
essa carona! Já na entrada da San Martin, o ônibus parou. O congestionamento
estava enorme (fato que já se tornou rotina no trânsito de Salvador, pelo
grande número de veículos que há na cidade e pela péssima infraestrutura de
tráfego. Salvador é uma cidade sem zona de escoamento de veículos. Se houver um
acidente, se houver operação tapa-buracos ou um caminhão de entrega parar na
lateral da pista, ninguém passa). Diante da lentidão do trânsito, eu cheguei a
ter a impressão de que eu não sairia daquele lugar hoje. Saí – depois de quase
meia-hora parado, diga-se de passagem. O “bolo” estava formado na entrada da
Santa Mônica, bem ali na frente da Igreja Universal do Reino de Deus. Após ter
passado dali, foi tranquilo.
Desci no Retiro. Ainda quando eu
estava atravessando as pistas para chegar ao ponto, avistei um Fazenda Grande
4/3/2 saindo da San Martin parado no semáforo. Tive até de dar uma corridinha
leve para não perder o buzu. Consegui chegar a tempo. Ao colocar o pé na porta
de entrada, constatei que havia outro babaca dentro do ônibus com o som do
celular no último volume tocando A Bronkka (argh!!). Respirei fundo. Procurei
um lugar para sentar, mas o foda é que o espaço interno entre uma cadeira e
outra é pequeno demais para mim, e por isso o meu joelho direito teve de ficar
espremido no encosto do assento da frente. Para completar, um cara bastante
parrudo sentou ao meu lado e, como o espaço também estava pequeno para ele, a
perna esquerda dele ficou colada à minha perna direita. Depois de alguns
minutos de incômodo recíproco, ele se deu conta de que não havia a menor
possibilidade de viajarmos daquele jeito, percebeu que a direita dele estava
livre e virou as pernas um pouco para o lado. Que alívio! Em Águas Claras, ele
se levantou, desceu da marinete e tomou o rumo dele. Ufaaaaaaaaa!!!
Lá estava eu, tranquilo e calmo,
lépido e fagueiro, acreditando piamente que não enfrentaria mais nenhum
empecilho na minha epopeia de volta para casa. Ledo engano. No meio da ladeira
de Cajazeira 8, outro congestionamento de trânsito. Normal, é assim mesmo; isso
acontece todo dia, aos sábados então?; o movimento da feira na Rótula da 10
para o trânsito todo; de 11 da manhã até as 3 da tarde, não há como não pegar
engarrafamento nesse trecho; relaxe. RELAXE O CARALHO!! Tô de saco cheio já de
tanto engarrafamento nessa porra! Será possível que ninguém mais consegue
transitar pela cidade sem perder tempo no trânsito. Há dez anos, os megacongestionamentos limitavam-se à região do Iguatemi. Hoje, é na cidade toda! Toda vez é isso? Enquanto não
houver transporte coletivo de qualidade, o pessoal continuar comprando carro adoidado e as vias de acesso permanecerem
estreitinhas, essa merda continuará do jeito que está. É daí pra pior. Eu
trabalho às 19h na segunda e na quarta e às 20h na terça. Entretanto, se eu não
sair de casa antes das 16h, há um grande risco de eu não chegar e perder o meu
dia. Eu tenho de achar normal isso? Eu tenho de aceitar que é assim mesmo?
Assim mesmo o cacete!
Como se não bastasse, após sair
do trecho mais crítico do engarrafamento, o motorista do ônibus que eu peguei
no Retiro inventou que estava com vontade de ir ao banheiro, botou bandeira de
Garagem, encostou o buzu no muro do Hospital Jaar Andrade e pediu ao cobrador
para colocar os passageiros em outro ônibus que vinha logo atrás (Fazenda
Grande 2/3 R2). Ao entrar, imaginem só o que aconteceu. Dei de cara com o mesmo
surfista mal-acabado, mal-encarado, usando os mesmos óculos escuros ridículos,
segurando a prancha e fazendo zoada dentro do ônibus com o celular no último
volume. Puta merda!!!!
Deu uma vontade tremenda de
descer e vir para casa andando. Contudo, eu estava muito cansado e com uma fome
de leão, e por isso resolvi aguentar mais uma vez até o ponto de ônibus perto
da minha casa. Se a minha avó Maria da Conceição estivesse aqui e ouvisse esse
relato, ela olharia para a minha cara e diria, do alto da sua sabedoria de
vida, o seguinte: “meu filho, fique tranquilo. A vida é assim mesmo. Em dia de
azar, o urubu de baixo caga no de cima”.
Mas eu tive uma notícia boa.
Tinha consulta marcada com o fonoaudiólogo hoje às 4 da tarde. Isso posto, eu
teria de ir pra casa, tomar um banho, trocar de roupa, comer e sair de novo.
Mas quando o ônibus estava passando pelo Jaguaripe (Conjunto Jaguaripe I, em
Cajazeiras. Não confundam com a praia de Jaguaribe, que fica localizada ao lado
da praia de Piatã, na orla de Salvador), ele ligou para dizer que havia passado
mal ontem e acordou hoje cheio de dores no corpo, e por isso não tinha a menor
condição de me atender. Não reclamei. Fui para casa, almocei com a digníssima e
fumei um charuto para relaxar. Afinal de contas, eu mereço. Depois desse épico, então...
Seria cômico, se não fosse trágico! Gostei...
ResponderExcluirProf. seu relato seria cômico se não fosse trágico, dei umas gargalhadas aqui rs...
ResponderExcluirRealmente o trânsito de Salvador está terrível mesmo, o tempo que perdemos dentro dos transportes públicos de Salvador é irreparável. Isso é frustante para nós quanto cidadães que paga imposto extremamente abusivos com a promessa de ter prestação de serviços público de qualidade!
E como diz sua saudosa vó e minha sábia vó e mãe “Em dia de azar, o urubu de baixo caga o de cima”!
Filho que dia,mas como disse em dia de azar o debaixo caga no de cima. O texto esta muito bom,hoje tive que sair e passei sufocos parecidos demora dos ônubus, engarrafamentos e ter que aturar alguns babacas. A cidade de Salvador está orrivel quando o assunto é trânsito e o mais importante é que os nossos governantes não estão nem ai. Vamos ver quando a copa começar em 2014.
ResponderExcluirKkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkk...
ResponderExcluirEstou rindo ''litros'',tipo uma comédia grega, abaiana pelas redondezas de Mar Grande e Cajaciy.
Muito bom!!!!
Também só assim pra poder superar as frustrações cotianas causadas pela falta de infraestrutura urbana dessa cidade e o descaso dos governantes.
Por que tá F.O.D.A pra todo mundo!!!
Ou nós nos mobilizamos e colocamos abaixo esse sistema, frente á uma revolução.
Ou é melhor seguir o conselho de vó Conceição(...) e continuar cantando a música de Chico Buarque: ''A gente vai levando,a gente vai levando, a gente vai levando essa vida!!!
Para ser o no Alex Castro, precisa melhorar um pouquinho. Mas táis no caminho certo.
ResponderExcluirPS: Tô em SSA até segunda!!! Se tiver como me ligue (19)83349995 é TIM
E quem disse que eu quero ser Alex Castro, Marquito? Que viagem é essa, véi?
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