Sábado à tarde, estava em casa
com a minha digníssima sem ter o que fazer e em busca de algum entretenimento.
Devido à nossa vontade de sair e após alguns minutos sem nenhum indicativo de
para onde ir, resolvemos rumar ao cinema para ver Reis e Ratos. Não havia lido nada sobre o filme: uma nota publicada
numa revista, uma resenha do caderno cultural do jornal A Tarde, uma análise feita
por algum crítico da moda ou coisa que o valha. Me limitei somente a uma propaganda
que vi no Jornal da Metrópole e ao título do filme, que achei instigante. A
única informação que busquei foi o elenco principal. Quando vi os nomes de
Paula Burlamaqui, Rodrigo Santoro, Seu Jorge, Otávio Müller e especialmente de
Selton Mello, concluí que seria bom arriscar. Quebrei a cara.
Putesgrila! O filme é confuso do
começo ao fim (até o fim, eu já não digo porque saí antes. Pelo menos até a
última cena que eu vi). Quando soube que a história estava periodizada na
década de 1960, quando apareceram os primeiros personagens fazendo alusões à
guerra contra o comunismo, o símbolo da foice e do martelo e os caracteres inicialmente
no alfabeto cirílico e, logo em seguida, traduzidos para o alfabeto latino,
pensei que o filme versaria sobre alguma coisa relacionada ao período da Guerra
Fria, mundo bipolar, divisão do mundo entre capitalistas e comunistas, Estados
Unidos de um lado e União Soviética do outro, essas coisas. De fato, o enredo
do filme está situado nesse período histórico, mas eu não consegui ver a
ligação entre uma coisa e a outra. Eu até me esforcei, mas não deu. Assisti ao
filme durante mais de uma hora, mas, por não ter conseguido entender nada,
joguei a toalha e casquei fora.
Eu não fui o único. A minha
digníssima, cuja paciência é bem menor do que a minha, chegou a cochilar nas
primeiras cenas por não aguentar tanta chatice, mas não debandou logo de cara após
olhar para o lado, me ver concentrado, achar que eu estava entendendo alguma
coisa e não querer estragar meu prazer (antes ela tivesse feito o contrário).
Uma quantidade significativa de pessoas também debandaram da sala muito
provavelmente por não terem compreendido porra nenhuma. Quando eu disse que
estava “voando” e propus a debandada, ela aceitou imediatamente e, ato
contínuo, “pegamos a pista”.
Eu até gosto do trabalho de
Selton Mello; para mim, ele é um ator fantástico. As atuações dele em Meu Nome Não É Johnny e em Jean Charles foram memoráveis, mas é a
terceira vez que eu saí puto do cinema por não ter conseguido entender a
mensagem que ele quis passar. A primeira vez foi quando eu assisti a O Cheiro do Ralo, filme do qual eu não
compreendi nada e não sei por onde começou, muito menos onde terminou. A
segunda foi quando eu assisti a O Palhaço.
Saí de casa cheio de expectativas: porra, deve ser legal, o primeiro filme dele
como diretor, ainda mais contracenando com Paulo José, uma boa pedida, vou lá
conferir. Resultado: me estrepei. A terceira (e, acredito eu, derradeira) foi no
último sábado.
E não venham me dizer que o
problema foi meu. Eu não sou o arauto da intelectualidade (estou longe disso), não
sou cinéfilo (pelo menos não me considero assim), não sou crítico de cinema,
nenhum José Wilker ou Rubens Ewald Filho da vida, mas também não sou nenhuma anta.
Não sei vocês, mas eu, já há algum tempo, parei de pensar que a culpa é sempre
minha por não ter entendido um filme ou um livro. A culpa pode ser também da
pessoa que escreveu, por que não? As pessoas falam a partir de códigos que são
inteligíveis (eu tenho de ter a capacidade de entender, mas a pessoa que
escreve ou produz também tem de ser clara ao emitir a mensagem). Se a diretora
Paula Lavigne e a equipe de produção do filme usou uma linguagem confusa
demais, acessível somente a elas mesmas e olhe lá, eu sou culpado por não ter
captado o que ela tentou dizer (se é que ela quis dizer alguma coisa)? Devo me
considerar intelectualmente limitado por isso? Eu sei que não terei tempo de
vida para entender tudo (e nem sei se isso é necessariamente bom), mas também
não acredito que devo pensar que sou uma besta quadrada por ter passado mais de
uma hora vendo uma porra de um filme e não ter assimilado nada do que vi. E
mais: além de o meu senso pretensamente intelectualóide não estar ligado o
tempo todo (será mesmo?), eu estou convencido de que há coisas na vida que não
foram feitas para serem entendidas. Ou eu aceito, ou eu não aceito. Eu penso
assim, e ninguém tem obrigação de concordar comigo (e nem o direito de me
xingar por eu pensar dessa forma).
Não vou perder um minuto do meu
sono sofrendo por não ter conseguido entender um filme ou um livro. Já perdi,
mas não perco e não perderei mais. Eu não consegui entender esse, mas já
entendi e tenho certeza de que ainda entenderei muitos outros. A vida é muito
curta.
Bola pra frente que atrás vem
gente. Eu já perdi muitas batalhas, mas as que entram – e entrarão - no meu
currículo são as que eu ganhei e as que eu ainda vou ganhar. Viremos a página e
prossigamos.
Para finalizar: eu não sou nenhum
ditador. Eu não escrevi esse texto para dizer o que as outras pessoas devem
fazer. Se quiserem ignorar o que eu disse e ir ao cinema ver esse filme, vão e
vejam. Afinal, cada um tem o direito de fazer o que quiser (e esse texto não é
nenhuma resenha fílmica, ou pelo menos não o escrevi com esse caráter). Não é
porque eu não entendi o filme que ninguém mais vai entender. Como já disse Martha
Medeiros, “eu não sirvo de exemplo para nada. Mas se alguém quer saber se isso
é possível, me ofereço como piloto de testes”.
Você está mais bem informado que eu, não tinha ouvido falar desse filme.
ResponderExcluirPor outro lado adorei "O Palhaço". Acho que estou ficando mateiga derretida, pois chorei em muitas sequencias do filme dirigido por Mello. Adorei a opção da linguagem "Clown". Mas gosto é igual a c... e todo mundo tem o seu.
Vou procurar para ver se consigo ver esse tal de Ratos e Reis e depois lhe digo.
Abração.
Reis e Ratos, Marquito. Não troque a ordem das palavras.
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