quinta-feira, 22 de abril de 2010

Sobre os campos de concentração cearenses (ou "o Brasil também já foi nazista?")

Quando nós ouvimos a expressão "campos de concentração", pensamos imediatamente nas prisões criadas pelos nazistas na Segunda Guerra Mundial para exterminar os "indesejáveis" da sociedade alemã: judeus, eslavos, homossexuais, ciganos... Símbolos máximos do horror causado pelos comandados de Adolf Hitler, alguns deles (Dachau, Auschwitz-Birkenau, Treblinka, Bergen-Belsen, Buchenwald, Mauthausen-Gusen...) foram transformados em museus e passaram a ser visitados por pessoas das mais diferentes regiões do mundo. Imagino que deve ser bastante deprimente visitar um lugar desse, mas ter conhecimento de uma das páginas mais macabras da nossa história recente é necessário para que nós tenhamos uma noção mais nítida das misérias que uma ideia maldosa pode levar um grupo de pessoas a fazer, e a partir daí empenhar o máximo das nossas forças para impedir que isso aconteça de novo. Eric Hobsbawm, no capítulo 1 do livro Sobre História, é muito claro ao dizer que os discursos também podem causar guerras e provocar danos iguais ou até maiores do que a explosão de uma bomba atômica - e eu concordo integralmente com isso.

Portão principal do campo de concentração nazista de Auschwitz, na Polônia. No alto, vê-se a inscrição "Arbeit Macht Frei", que pode ser traduzida para o português como "o trabalho faz a liberdade".

No entanto, isso não foi exclusividade dos nacional-socialistas alemães. No Ceará, também foram criados locais iguais a esses em regiões estratégicas do agreste cearense e em algumas cidades da região metropolitana de Fortaleza. O objetivo dessa medida era impedir que os retirantes da seca (chamados à época de "molambudos") conseguissem chegar à capital cearense em busca de melhores condições de vida e, por consequência, pusesse por terra o plano das elites cearenses de "civilizar" e "modernizar" as ruas e avenidas da cidade. Vale dizer que "campo de concentração" não é um termo importado da Alemanha, mas uma denominação presente nos jornais cearenses da época (começo do século XX) e bem anterior à construção do primeiro campo de concentração nazista, localizado na cidade alemã de Dachau.

Além disso, devemos destacar que enquanto os jornais chamavam esses locais de "campos de concentração", a população concentrada chamava de "currais do governo", o que é uma clara demonstração de que as pessoas que foram lá jogadas sabiam muito bem o que estava acontecendo, quem eram os responsáveis por aquela situação, tinham total consciência dos objetivos pretendidos com essa medida e como eram vistas e tratadas - como animais!

O programa Mais Você, da Rede Globo, veiculou uma reportagem sobre isso na edição de hoje, 22/04/2010. Confiram aqui:


Eu não gosto muito das fuçanhas de Ana Maria Braga. Para mim, ela é uma mulher fútil e que não acrescenta nada na vida de ninguém; penso que há coisas muito mais interessantes que as mulheres brasileiras precisam aprender do que somente cozinhar, fazer artesanatos idiotas e assistir a entrevistas com pessoas tão vazias quanto ela. No entanto, levantei da cama hoje e assisti a essa reportagem porque o tema é interessante e revelador de uma realidade escondida por muito tempo do conhecimento público (não é por acaso que os Racionais MCs disseram para a gente ter fé porque até no lixão nasce flor). Havia lido um texto sobre o assunto há cerca de quatro ou cinco dias, e fiquei mais chocado ainda quando vi, tanto no texto como na reportagem, relatos de algumas sobreviventes dos campos de concentração brasileiros.

Vocês, eu não sei. Mas no momento em que eu vi esse vídeo, eu associei imediatamente a imagem da linha do trem próxima ao campo de concentração de Senador Pompeu com a imagem da chegada dos trens trazendo "carregamentos" de judeus ao campo de concentração nazista de Auschwitz (quem assistiu ao filme A Lista de Schindler sabe do que eu estou falando). Isso serve para nós entendermos que aqui, bem pertinho de nós, houve quem fizesse coisas bem mais odiosas e execráveis do que os nazistas, e que devemos nos olhar mais no espelho antes de falar dos defeitos e misérias que acontecem nos países dos outros. Afinal de contas, por que aqueles que criticaram tanto a postura do presidente Lula com relação aos presos políticos cubanos ficaram calados até hoje sobre o caso dos campos de concentração cearenses? Será que ninguém sabia disso?


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