quinta-feira, 20 de agosto de 2009

O "jeitinho" inglês (ou o Brasil não é uma maravilha, mas também não é a lata de lixo do mundo).

Liguei o computador hoje a fim de escrever sobre outra coisa, mas mudei de ideia ao ver uma reportagem na página do UOL. Vi um vídeo sobre o caso das duas mulheres inglesas que foram presas no Rio de Janeiro acusadas de tentar aplicar um golpe conhecido como golpe do seguro. Foi assim: após terem chegado ao Brasil e se hospedado no hotel, elas foram a uma delegacia de polícia e disseram que foram roubadas, e que o ladrão havia levado toda a bagagem delas, tudo isso para receber o dinheiro do seguro. Entretanto, os policiais desconfiaram e resolveram ir ao hotel onde elas estavam hospedadas e constataram que se tratava de um golpe, pois todas as coisas que supostamente haviam sido roubadas estavam lá. Resultado: as duas foram presas e acusadas de tentativa de estelionato (art. 171 do Código Penal Brasileiro) e comunicação de crime inexistente (art. 340).

Hoje, um mês após o crime, elas foram julgadas e condenadas a um ano e cinco meses de prisão, mas a pena poderá ser convertida em prestação de serviços à comunidade. Os passaportes das duas estão retidos pela polícia desde o dia em que as duas foram presas, mas a defesa entrou com um pedido de liberação dos dois documentos na justiça. Resta saber se elas permanecerão no Brasil para cumprir a pena caso os passaportes sejam liberados (o que vocês acham?).

O que mais me revoltou foi a reação de algumas pessoas demonstrada na seção para comentários da matéria. Algumas pessoas disseram que a pena foi “muito dura”, que “não havia necessidade de tanta rigidez”; houve um que disse que acha temerário que essas inglesas prestem serviços comunitários aqui no Brasil; “por que não se faz uma operação padrão igual a essa no Senado?” Esses foram alguns dos impropérios disparados lá.

Eu fiquei pensando cá com os meus botões: “brasileiro é muito idiota mesmo”. Quanto sentimentalismo barato! Estão com peninha? Levem-nas para as vossas casas. A justiça brasileira está corretíssima ao ter condenado essas duas golpistas. Se duas brasileiras tivessem feito isso na Inglaterra, elas já teriam sofrido o diabo nas mãos da polícia inglesa; a essa hora, estariam presas na cadeia mais imunda da Inglaterra, incomunicáveis e sofrendo todo tipo de tortura física e psicológica – isso se já não estivessem mortas, é claro.

Aliás, os brasileiros nem precisam cometer crimes para serem maltratados lá. Até onde eu sei (corrijam-me se eu estiver errado, por favor), não é necessário tirar visto para entrar na Inglaterra. É um oficial do serviço de imigração inglês que decide se nós podemos entrar no país ou não. Isso quer dizer que se eu chegar ao aeroporto de Londres e o oficial for com a minha cara, eu serei autorizado a entrar. Caso contrário, eu terei de pegar os meus paninhos de bunda e voltar para o Brasil – ainda que a minha documentação esteja toda regularizada.

Casos de abuso da polícia inglesa contra brasileiros não faltam. No momento, só me lembro de dois: uma mulher (não me lembro de onde) que passou anos juntando dinheiro para pagar um intercâmbio de curso de inglês em Londres, mas teve de voltar para o Brasil porque o policial simplesmente não foi com a cara dela, e outro de uma menina do interior da Bahia (esqueci de qual cidade) que foi fazer turismo e foi tratada pior do que um cachorro pelos policiais. A coisa foi tão grave que a menina menstruou enquanto esteve presa no cubículo onde foi posta no aeroporto e os canalhas não permitiram sequer que ela fosse ao banheiro para se limpar e trocar o absorvente. Quem souber de mais algum exemplo, que se manifeste.

Outras pessoas ficaram penalizadas pelo fato de as duas pilantrinhas de meia-pataca terem ficado presas durante seis dias na penitenciária feminina de Bangu e sido condenadas a um ano e cinco meses de cana. Oooooh, meu deus! Coitadinhas das pobrezinhas!! E o que aconteceu com Jean Charles lá no metrô de Londres, cambada, vocês já esqueceram? O cabra era inocente, não tinha nada a ver com a situação, mas levou sete tiros na cabeça em uma ação atabalhoada da Scotland Yard (considerada a melhor polícia do mundo [eu nem quero imaginar como é a pior]) só porque foi confundido com um terrorista. Bem que os policiais poderiam tê-lo prendido e averiguado os fatos, mas preferiram matá-lo para dar uma resposta rápida à sociedade inglesa, atônita com os atentados à bomba no metrô de Londres. Bem que os mais experientes dizem que memória de brasileiro é curta.

Não podemos esquecer também o caso de Ronald Biggs. Um ladrão safado, que assaltou o trem-pagador britânico em 1963, fugiu da cadeia, veio para o Brasil, rapidamente descobriu que estrangeiro que tem filho brasileiro não pode ser extraditado, e por isso emprenhou a primeira que passou pela frente dele para gozar desse benefício. Resultado: ficou aqui no Brasil durante mais de trinta anos, tirando onda de bon vivant, e só retornou à Inglaterra por livre e espontânea vontade em 2001 porque estava doente e sabia que não teria direito a tratamento médico aqui no Brasil.

Eu só espero que o caso dessas duas golpistazinhas inglesas sirva para que nós paremos de pensar e dizer por aí que gente pilantra, trambiqueira, que gosta de levar vantagem em tudo só existe aqui no Brasil; que o Brasil é o “país do jeitinho”. Gente, o “jeitinho” não é brasileiro, e sim mundial.

2 comentários:

  1. Concordo plenamente, chega de achar que mal caratismo é coisa de terceiro mundo, esse problema é de caráter, sendo humano, é mundial.

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  2. O pior de tudo é ver muita gente escandalizada toda vez que um gringo, loiro e de olhos azuis tenta aplicar um golpe, mas fica totalmente relax quando a falcatrua é cometida por um brasileiro. Reação típica de quem pensa "ah, só poderia ser brasileiro mesmo!!"

    Por que ficamos escandalizados quando o golpista é gringo, mas achamos tão natural quando o golpista é brasileiro?

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