Como se diz na gíria, parece
que eu pisei em rastro de corno na sexta-feira passada. Eu não me lembro de ter
enfrentado dificuldades tão grandes para chegar ao trabalho como neste dia.
Lembro de uma, mas quando estava voltando para casa. Parece mentira ou exagero da minha parte, mas eu vou contar a história
aqui e sintam-se à vontade para tirar as vossas conclusões.
Acordei predisposto a fazer
uma megafaxina, pois a casa onde moro estava uma zona. Só que antes eu tive de
corrigir um texto escrito pela digníssima, que ela pretendia publicar no blog
dela - e publicou. Assim que eu terminei, eu devolvi
o texto para ela com as correções e peguei o garrafão de água vazio para
comprar outro cheio no bar de Alemão. Pretendia iniciar a faxina com a lavagem
do banheiro (que estava fétido) assim que retornasse. Entretanto, quando estava
me preparando para sair de casa, a digníssima recebeu uma ligação do irmão dela
para dizer que o pai dela havia passado por um problema pessoal (que não vem ao
caso mencionar aqui). Ao saber disso, a digníssima tresloucou. Desligou o
computador de qualquer jeito, pegou a carteira de identidade e o celular e saiu
em direção ao local onde o pai dela estava. Eu tive de sair com ela, pois seria
muita insensibilidade da minha parte deixá-la sair sozinha naquele estado de
nervos.
Felizmente, não foi nada grave. O problema foi resolvido rapidamente, e o pai dela voltou para casa sem que nada de mais grave tivesse acontecido.
Felizmente, não foi nada grave. O problema foi resolvido rapidamente, e o pai dela voltou para casa sem que nada de mais grave tivesse acontecido.
No caminho de volta para
casa, passamos em frente a uma loja de roupas e a digníssima viu uns vestidos
que chamaram bastante a atenção dela. Entramos na loja. Ela pegou três (um
vermelho, um amarelo e um azul) e pediu a minha opinião. Só que nesse exato
momento, eu recebi uma ligação no celular e parei para atender. Como ela viu
que eu estava ocupado, ela preferiu decidir sozinha qual vestido comprar. Optou
pelo azul. Só vi o vestido em casa, depois que ela o lavou e o colocou no varal
para secar. Gostei da escolha. Azul é uma cor que me agrada bastante.
Lavei o banheiro. Quando
terminei, já havia passado das duas da tarde. Sujo, com o corpo cheirando a
água sanitária e sabão em pó e o estômago roncando de fome, saquei que o meu
plano de sair de casa às 15h havia ido por água abaixo. Mas acelerei. A
digníssima improvisou uma comida com celeridade para eu não sair de casa com
fome. Tomei um banho rápido, almocei com ela, arrumei minhas coisas, vesti a
roupa e saí. Já era quase 15:30h quando eu botei o pé fora de casa rumo a Mar
Grande, onde dou aula.
Tive de andar até a Rótula
da 10 para pegar um buzu, pois não quis me arriscar a esperar um dentro de
Fazenda Grande 2 (tudo isso em Cajazeiras, bairro onde moro). Andei, andei, e
não passou nenhuma marinete que servisse para mim. Cheguei à Rótula às 16h.
Cerca de dois minutos depois, passou um Estação Mussurunga da empresa BTU. Seria
uma alternativa boa, pois esse buzu não entra em Fazenda Grande 3 nem em Vila
Verde e, lá em Mussurunga, eu pegaria um Barra 1 (da empresa Ondina, código de
linha 1051) e chegaria ao Comércio numa boa. Mas eu desisti por acreditar que
ficaria retido no engarrafamento da Paralela (que começa no Shopping Paralela e
vai até a entrada do Imbuí), o que seria um obstáculo ao meu plano de chegar ao
Terminal da Lancha, no Comércio, a tempo de pegar a lancha de 17:30h. Aproximadamente
dez minutos depois, apareceu um Estação Pirajá R1, da empresa Barramar. Peguei
o buzu, pois queria sair logo dali. O motorista dirigiu numa lerdeza
desgraçada. Parava em todos os pontos e parece que ganhava por passageiro. A
vontade que me deu foi de levantar e meter os meus dois pés na cara dele, mas
achei por bem não fazer isso porque seria pior, poderia causar um acidente mais
grave e fatalmente eu não chegaria a tempo. Contive-me.
Desembarquei na Estação
Pirajá às 16:39h. Vi que a fila do Barra 1 (da empresa Barramar, código de
linha 1335) estava relativamente grande, mas não havia nenhum buzu parado no
ponto. Encostou um Lapa. Após alguns segundos, concluí que seria prudente,
apesar de desgastante, pegar logo aquele ônibus, descer na Lapa e andar (ou
melhor, correr) até o Terminal da Lancha. Se eu ficasse lá à espera do
famigerado Barra 1, certamente chegaria atrasado. Novamente, o motorista estava
dirigindo com uma lerdeza que parecia que estava levando o pai dele com desvio
de coluna dentro da marinete. Que porra era aquela? A BR livre, o Acesso Norte
livre, e ele dirigindo naquela lentidão! Parecia que ele estava adivinhando que
eu estava atrasado e resolveu me sacanear ainda mais. Quando o buzu passou pelo
viaduto que liga a Rótula do Abacaxi à Avenida Bonocô, vi o Barra 1 que sai da
Estação Mussurunga passando lá embaixo, saindo da Avenida ACM em direção à
Rótula do Abacaxi. Pensei na hora: “Está vendo aí? Se tivesse pego o Estação
Mussurunga da BTU na Rótula da 10, eu certamente estaria dentro daquele buzu
que está passando lá embaixo e chegaria ao Terminal da Lancha mais cedo e com
mais tranquilidade”. Mas dane-se! Já estou aqui mesmo, e o jeito agora é dar
continuidade ao processo.
O motorista do ônibus que
seguia em direção à Lapa deu uma matracadazinha na Bonocô. Não havia ninguém
para descer nos dois primeiros pontos, mas ele quis porque quis passar pela
faixa da direita para encostar nos pontos. Me contive para não soltar uma porra
bem alta. Entrou no Vale do Ogunjá na mesma matracagem. Na Vasco da Gama,
então, é que lenhou de vez. A via exclusiva estava livre, mas o safado estava
mesmo a fim de me pirraçar. Chegou ao Dique, e havia um pequeno
congestionamento. Não sei por que raios, mas aquela sinaleira nunca está
liberada quando eu passo por lá. Sempre tenho de esperar os carros que vêm da
Fonte Nova passar primeiro para eu passar depois. Um saco!
Desembarquei na Lapa às
17:06h. Prometi para mim mesmo que não entraria mais naquela pocilga (contarei
o motivo em outro texto), mas tive de quebrar a promessa hoje por conta da
situação. Subi as escadarias correndo, colocando o braço na frente
“educadamente” para mostrar às pessoas que eu estava com pressa e precisava
passar. Algumas compreenderam – e eu não me preocupei com as que não
compreenderam. Subi a escada rolante que dá acesso aos fundos do Colégio
Central no mesmo ritmo: colocando o braço, pedindo licença e passando. Tirei a
mochila das costas e segurei-a com a mão direita para poder andar com mais
velocidade. Não tive paciência para esperar a sinaleira em frente ao IPS (Instituto
de Previdência Social) ficar verde para os
pedestres, aproveitei um mole dado por um taxista e passei. Ao entrar na
transversal que dá acesso à Rua do Paraíso, tomei um tropeço desgraçado, "catei umas fichas" e caí estatelado
no chão. Só não bati a cabeça na calçada e quebrei alguns dentes porque estava
segurando a mochila com a mão direita, como já disse, e, na queda, a mochila
foi parar debaixo da minha cabeça e amorteceu o impacto. Pura sorte. A garrafa
com água que eu estava carregando caiu para o lado oposto da mochila. Ao me ver
estatelado no chão, uma mulher parou para tentar me ajudar. Eu, rapidamente,
botei as mãos no chão, levantei e continuei correndo. A mulher, ao me ver
esbaforido, só teve tempo de dizer: “moço, a garrafa está ali”. Eu peguei a
garrafa, enfiei-a de novo no bolso lateral da mochila e continuei andando. Nem
olhei para a cara da senhora que foi tão solícita comigo ao me ver esparramado
no meio da rua, o que denota o quão atarantado eu estava.
Entrei na Rua do Paraíso e
passei pela Barroquinha chispando. Tentei subir a Ladeira da Praça correndo,
mas não tive fôlego para isso (que falta me faz as minhas corridas matinais).
Já era 17:21h. O desespero bateu, pois eu perderia o carro que me levaria a
Tairu (que sai da Praça do Duro, em Mar Grande, pontualmente às 18:20h) se não
conseguisse pegar a lancha de 17:30h. Andei o mais rápido que pude. Cheguei à
Praça Municipal e entrei no Elevador Lacerda. Por sorte, não havia fila.
Passei, meti a mão no bolso, tirei os R$ 0,15 necessários para pagar a passagem
e parei na porta para esperar o elevador que me levaria à Cidade Baixa. Quando
eu estava lá, suando em bicas, todo desgoelado, com a mão esquerda ralada e sentindo a porrada que levei
no joelho esquerdo por conta da queda, recebi uma ligação de uma das
coordenadoras do Quilombo do Orobu (cursinho pré-vestibular no qual também dou aula) perguntando se eu daria aula lá na sexta à noite.
Disse que não. Marcos Paulo, o cabra que faz dupla de área comigo na matéria de
CCN (Cidadania e Consciência Negra), assumiu o babado sozinho. Estava azoado, e
espero não ter sido grosseiro com Tice, pois ela não merece isso. Se fui, peço
desculpas aqui publicamente. Eu não estava em condições de raciocinar.
Finalmente desembarquei do Elevador
Lacerda. Cheguei à Cidade Baixa. O relógio marcava 17:25h. Na hora de
atravessar a rua, vi que o semáforo em frente ao Mercado Modelo estava marcando
54 segundos para os carros passarem. Não quis esperar. Aproveitei que havia um
buzu parado no ponto, avancei, olhei com cuidado, vi que não havia nenhum outro
veículo passando por fora, e adiantei. Cheguei ao Mercado Modelo. Passei por
dentro mais rápido do que uma bala, dei umas pequenas trombadas na turistada
otária que estava no meu caminho, e cheguei ao outro lado. O Terminal estava a
alguns metros de mim, mas parecia que estava a anos-luz de distância. Avancei. Consegui
chegar à fila. Na hora em que eu estava me dirigindo ao guichê, duas mulheres andando
em diagonal atrapalharam involuntariamente a minha passagem. Botei meu braço na
frente, passei, tirei o dinheiro do bolso (que, para minha alegria, já estava
trocado), passei pelo torniquete e cheguei à lancha. Ufaaaaa!! Que alegria!!!!
Consegui pegar a lancha de 17:30!!!!!!!!!
Achei um lugar na popa, e me
sentei. Alguns minutos depois, chegou meu amigo e futuro médico Mota, professor
de Biologia do Quilombo Ilha. Gritei e sinalizei com
o braço para ele me ver e sentar ao meu lado. Ele me viu. Sentou. Fizemos a
travessia numa boa, e aproveitei o balanço da lancha para papear um pouco e
esfriar a minha cabeça – que estava bastante agitada por conta de tudo o que
aconteceu. Afinal de contas, eu não conseguiria trabalhar do jeito que eu
estava.
A conversa estava tão boa e
agradável que eu esqueci de levantar um pouco antes para não ficar retido no
bololô que se forma na saída da embarcação. Quando a lancha atracou em Mar
Grande, eu tive de esperar minutos preciosos para conseguir alcançar o lado de
fora. Saí. Com pressa. Na minha frente, havia pessoas andando na maior lerdeza
do mundo. Ultrapassei duas. Porém, havia outro que, além de andar devagar, era muito parrudo. Tentei duas vezes ultrapassá-lo, mas não consegui. O espaço
estava estreito. Quando ele finalmente deu uma inclinada à esquerda, eu passei
chispando e, na passagem, tombei no braço direito dele. Ao sentir a porrada, ele pediu
desculpas. Eu respondi que “quem tem de pedir desculpas sou eu, pois eu estou
com pressa”. O carro para Tairu sai de Mar Grande, como já disse acima, às
18:20h. Consegui chegar às 18:18h. Meu amigo Ademilton, professor de Física, já
estava ligando para mim a fim de saber se eu chegaria a tempo ou não.
Felizmente (e desesperadamente), cheguei.
Estava com vontade de ir ao
banheiro, e pedi ao motorista para parar em frente à casa paroquial, onde
funciona o Quilombo Ilha, pois eu não suportaria esperar mais. Fui correndo ao
banheiro. Fiz o que tinha de fazer. O carro veio. A porta foi aberta. Eu
entrei. Era 18:30h. Eu viajei. Cheguei a Tairu às 18:54h. Ainda bem que Gevaldo
já havia deixado tudo pronto para eu entrar e trabalhar numa boa.
Que dificuldade!!!
No dia seguinte, aceitei a
sugestão da digníssima e passei o dia na praia com ela. Tomei sol, alguns
litrões, papeei e sosseguei um pouco. Afinal de contas, eu mereço. Ainda mais
depois de ter enfrentado toda essa epopeia para chegar ao meu local de
trabalho no dia anterior.
Tive de (d)escrever toda
essa épica trajetória Salvador-Mar Grande para demonstrar minha indignação
diante do caos em que se encontra a cidade e dizer que está cada vez mais
insuportável viver e sobretudo transitar em Salvador.
Está cada vez mais difícil transitar em Salvador. Cumprir seus horários pior ainda. Muitas das vezes eu passo mais tempo dentro do ônibus, do que na sala de aula. Muitas vezes leio algum livro, cochilo, leio novamente e, nem esperança de chegar ao meu destino. Está um caos, Salvador, um caos!
ResponderExcluirParabéns meu querido professor pelo texto.
Ah professor, nosso trânsito nos faz perder tempo de vida!! Fora isso, quando estamos com muita pressa parece que o mundo faz pirraça e vai mais devagar, mas não sei se ele que está muito lento ou nós que estamos muito acelerados.
ResponderExcluirAlém de exemplificar as dificuldades que a nossa cidade nos traz e ser totalmente compreensível o fato de não querer mais pisar na Lapa(eu tb sofro toda vez que tenho que ir ao Seteps) e senti o descaso público e conformismo social a que nos entregamos, vc tb é exemplo do trabalhador (professor) ético, comprometido, faz toda sentido ensinar uma disciplina de cidadania, tvz fosse muito simples p/ alguns desistir de ir e depois justificar. Em fim, e falando em escrever bem, é coisa de família né? Sua esposa tb manda vê, vou seguir o blog dela. Ah, fora isso, mesmo sendo trágico tb foi bastante cômico esse seu dia viu!!
Mestre, vc tem andado muito apressadinho.. heheheh. A cidade tá intransitada e cada dia pior... lembro que o finado ex prefeito disse que a culpa era dos fabricantes de carro.... E do povo que anda comprando muito carro...
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